De modo geral, comércio internacional pode ser um setor particularmente complexo. No Brasil, porém, essa complexidade pode ser ainda maior, devido a uma série de fatores adicionais, tais como os gargalos logísticos, a falta de clareza na legislação específica ou, até mesmo, na falta dela. E, certamente, um dos temas mais complexos é a demurrage.

Os temas que mais exigem atenção redobrada são os ligados ao transporte marítimo, justamente porque, muitas vezes, não existe um entendimento assertivo e muito menos uma Lei Federal para regulamentar o tema. Desse modo, se faz necessária a intervenção do Sistema Judiciário para decidir sobre a questão.

No presente texto, exploraremos a temática da demurrage, onde você conseguirá saber o que é, porque é cobrada, como é calculada, e porque é tão temida no comércio exterior.

Vamos lá?

O que é demurrage?

Para realizar o transporte marítimo internacional, o armador disponibiliza o contêiner para o transporte da mercadoria, desde a origem até o destino.

Nesse momento, é também acordado o free time, ou seja, o período que o importador tem para devolver o equipamento ao armador, contado a partir da data de chegada do navio ao porto.

Com isso, a demurrage, é a cobrança pelo descumprimento do prazo para devolução do contêiner ao armador. Este cobra um valor por dia de atraso e, quanto mais longo o período para devolução, maior será o valor final da cobrança.

Por que se cobra a demurrage?

O fluxo logístico mundial no transporte marítimo na importação apresenta uma grande variação em termos de volume nas diversas rotas atualizadas nos dias de hoje. Em outras palavras, essas instabilidades nos permitem constatar que em alguns portos podem sobrar contêineres, enquanto outros portos podem sofrer com a falta desses equipamentos.

Assim sendo, o descumprimento do prazo para devolução dos contêineres pode ocasionar problemas logísticos e de ordem financeira. Entre estes problemas, podemos citar atrasos, majoração dos custos operacionais, e até mesmo o congestionamento dos portos. 

Por consequência, a cobrança da demurrage pelo armador é justamente uma tentativa de não comprometer a eficácia operacional, forçando os importadores a devolverem o equipamento dentro do tempo previamente estabelecido.

Como se calcula a demurrage?

Comumente, no momento da contratação do frete internacional, o armador negocia o free time, sendo este um prazo que varia entre 5 e 30 dias. Após este período, considera-se o início da cobrança da demurrage. Esta cobrança é calculada diariamente, de acordo com o tipo de contêiner utilizado para realizar o transporte marítimo. 

Vale ressaltar ainda que, via de regra, os armadores possuem uma tabela para a cobrança, e quanto maior o tempo para devolução, mais cara fica a diária.

Por que essa taxa é tão temida no comércio exterior?

O temor pela ocorrência da demurrage, por parte da empresa importadora, se dá tanto por motivos financeiros quanto operacionais.

Afinal, atrasos entre a saída do porto e a devolução do contêiner provocam atraso na chegada do produto, na qualidade e na quantidade desejada. Além disso, este fato causará custos extras, que impactam a formação de preços e reduzem a margem de lucro. 

O atraso também pode influenciar em aspectos negociais e contratuais, bem como estremecer as relações comerciais, tanto nas importações por compra e ordem, quanto na utilização de uma trading company.

Existe possibilidade de evitar a demurrage?

A maioria dos fatores não estão sob o controle direto da empresa. É o caso do tempo necessário para descarregar o navio, a sua movimentação no porto, a fiscalização por parte da Receita Federal do Brasil (RFB). Apesar disso, ainda existem, sim ações que podem evitar a demurrage.

A principal delas é contar com um parceiro que seja capaz de cooperar na negociação para obtenção de um maior free time. De igual modo, esse profissional pode auxiliar demonstrando agilidade e assertividade nas ações pertinentes do desembaraço aduaneiro.

Outra possibilidade é, justamente, ter um controle interno, que estabeleça prazos e movimentos. Estes controles contribuem para a identificação de gargalos e possibilidades de melhorias entre a retirada, a desova e a devolução do contêiner no terminal de vazios do armador.

Por fim, uma opção que exige análise cuidadosa, para que não seja uma simples troca de custos, é verificar a possibilidade de remover a carga do porto por DTA (declaração de trânsito aduaneira) para outro recinto alfandegado. O objetivo é realizar a desova do contêiner antes do registro da Declaração de Importação (DI) / Declaração Única de Importação (DUIMP). Dessa forma, pode-se seguir com a devolução do equipamento.

Existe fundamento legal para a cobrança da demurrage?

Segundo informações da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ), não existe uma Lei Federal que regulamente a demurrage.

Logo, quando não existe uma lei, consequentemente, existe a necessidade de realizar um questionamento. Então, torna-se obrigatório ingressar com uma ação judicial, pois um juiz precisará decidir sobre o referido tema.

Com isso, consegue-se perceber a necessidade latente da proposição e implementação de uma lei federal a respeito do tema, pois até que seja formado “um conjunto de decisões que refletem o entendimento de um tribunal acerca de uma matéria específica” (jurisprudência), pode haver decisões divergentes entre si, decorrentes do entendimento particular de cada juiz.

Além disso, mesmo não havendo uma base legal, as empresas que desejarem ter mais clareza sobre a parte técnica e conceitual da demurrage podem consultar a Resolução Normativa nº 18 – 2017 da ANTAQ.

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